O que é o Antropoceno?


Prof. Alexandre Costa



"Homogenoceno" foi um termo predecessor e que apareceu em publicações de Ecologia. A referência era à homogeneização da biosfera via introdução de espécies invasoras pela ação humana.
O termo "Antropoceno" aparece nesta publicação de 2000, num artigo de P. Crutzen e E. Stoermer. O artigo foi publicado na "Global Change Newsletter"

O termo "Antropoceno" consolidou-se. Ele vem da junção do grego "anthropos" (ἄνθρωπος), ou seja "humano" com o sufixo "ceno", do grego kainos (καινός). Refere-se à passagem da espécie humana como fator dominante das mudanças globais, superando até processos de escala geológica.

Apesar de ainda não formalizada pela IUGS (International Union of Geological Sciences), as evidências apontadas pelo "Grupo de Trabalho do Antropoceno" (AWG, da sigla em inglês) são nítidas no sentido de que é preciso estabelecer uma nova subdivisão geológica.

No AWG há bastante consenso de que o Antropoceno é real e corresponde a um "golden spike" na estratigrafia. A ampla maioria é favorável a defini-lo como uma nova "época geológica", sucedendo o Holoceno, mas houve votos a favor de que fosse definido como novo Período ou mesmo Era!

Imagine que Geologia/Arqueologia/Paleontologia sejam desenvolvidas uma segunda vez na Terra (por, sei lá, descendentes dos cefalópodes atuais) ou que uma civilização extraterrestre visitasse nosso planeta milhões de anos no futuro. Iriam encontrar nossos traços nas rochas!

De tecnofósseis (já imaginaram ao invés de uma trilobita, peixinho ou samambaia aparecer o desenho de uma placa-mãe numa rocha?) a mudanças isotópicas no carbono, da presença de plástico e alumínio à bioestratigrafia. Tudo mudou e a mudança ficará gravada na crosta do planeta!

Mas nada será tão surpreendente para o polvo geólogo ou o cosmonauta ET quanto a descoberta de PLUTÔNIO na rocha, gerado pelos testes nucleares. Sim, esse elemento é quase inexistente no Universo (estrelas comuns produzem até Ferro na fusão nuclear e supernovas até Urânio).

O conceito de Antropoceno está conectado ao de Limites (ou Fronteiras) Planetários que não devem ser ultrapassados: clima, biodiversidade, uso de água doce, mudança no uso do solo, ciclos biogeoquímicos de N e P, pH oceânico, O3 estratosférico, aerossóis e "novas entidades"


A fronteira considerada segura para o clima era a de uma concentração de CO2 de 350 ppm (o que levou importante ONG climática a adotar o nome @350). Esse valor foi ultrapassado em 1988, por triste ironia o mesmo ano em que a ONU criava o @IPCC_CH. Hoje, estamos acima de 400 ppm!
O valor de 391 ppm, registrado em 2011, já era suficiente para produzir um desequilíbrio energético de +1,68 W/m2 só pelo CO2. A contribuição dos demais fatores (incluindo outros gases de efeito estufa) joga esse número para impressionantes +2,29 W/m2.
Not-Fun Fact:
Multiplicando 2,29 W/m2 pela área aproximada da Terra (4πR²), com R=6371km, isso dá a impressionante quantidade de 1168 TW (TeraJoules) de calor sendo acumulado pelo aquecimento global. Ou, se preferirem, 18,5 bombas de Hiroshima (63TJ cada).

Concentração de CO2 cresce hoje a uma média hoje acima de 2ppm/ano ou 200 ppm/século. Durante o Holoceno, as variações foram da ordem de 0,17 ppm/séc entre 11000 e 7000 anos e de 0,30 ppm/séc daí até o período pré-industrial
Fonte: Gaffney e Steffen (2017)

Isso é 100 vezes mais rápido do que a variação observada na última desglaciação. É 10 vezes mais rápido do que o aumento verificado durante o maior aquecimento da Era Cenozóica, processo que levou ao máximo térmico do Paleoceno-Eoceno (PETM) há 55,8 milhões de anos.
No que diz respeito ao metano, potente gás de efeito estufa (86 vezes mais potente que o CO₂ na escala de 20 anos e 34 na escala de 100 anos considerando feedbacks), sua concentração cresceu de 722 para 1810 ppb nos tempos industriais.

Esse aumento de 150% em intervalo de tempo tão curto é literalmente sem precedentes. As variações naturais durante o Holoceno eram da ordem de 2 ppb/século e a taxa de crescimento atual é simplesmente 285 vezes maior.

Isso para não falar nas emissões de N₂O e gases halogenados (CFCs, HFCs, HCFCs, CCl₄, CH₃Br, CH₃CCl₃, SF₆, PFCs etc.) que nunca haviam existido na atmosfera terrestre, alguns com potencial de aquecimento global milhares de vezes o do CO₂, fora impactos como no ozônio.
A acumulação desses GEEs produziu um aquecimento em torno de 1°C acima das temperaturas pré-industriais. Enquanto o mundo aquece hoje a uma taxa impressionante de 0,17°C/década, as variações de temperatura global durante o Holoceno foram bem pequenas, da ordem de 0,01°C/século!

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